O primeiro trimestre de 2020 chegou ao fim ontem, quarta-feira (31/04). Nesse período, de três meses, tantos fatores e acontecimentos foram vistos que poderíamos pensar ter se passado, ao menos, um ano.

No dia 8 de janeiro, o Ibovespa bateu seu recorde histórico e fechou a 125.077 pontos, em meio à euforia que, à época, tomava conta do mercado e dos investidores. Porém, agora, no balanço do trimestre, o Índice acumula uma queda de 2%, tendo fechado ontem a 116.634 pontos.

A queda só não foi maior, inclusive, pela alta do Ibovespa de 6% em março, impulsionada, principalmente, pelo avanço de ações ligadas a commodities.

No período, ações como Braskem PNA (BRKM5) e Embraer ON (EMBR3) tiveram altas impressionantes de, respectivamente, mais de 68 por cento e mais de 58 por cento.

No outro lado da moeda, ações como Via Varejo, EzTec e IRB Brasil Re caíram mais de 25 por cento.

Iniciamos o ano com uma visão, pode-se afirmar com parcimônia, relativamente positiva para o coronavírus e a reabertura da economia. Agora, o jogo virou: nos últimos dias, temos visto o número de mortes passar a casa dos 3.000. A fase roxa, mais rígida com as reaberturas e que tomou conta dos últimos dias do trimestre em boa parte dos Estados, foi estendida até o dia 11 de abril em São Paulo, por exemplo.

E isso para não falar na questão da vacinação e no cenário político, que se mantém conturbado...

Estamos, pois então, no céu ou no inferno? Regredindo ou progredindo? Ou, melhor, indo direto ao ponto: O que nos espera à frente em relação aos investimentos?

Calma. Esta é a palavra da vez: calma.

Em momentos como o atual, de incertezas e tensões, ser guiado pela histeria que toma conta de boa parte da mídia e de investidores mais iniciantes é um erro “fatal” – pelo menos quando falamos do universo dos investimentos.

Entender o que ocorreu no primeiro trimestre do ano e aquilo que pode ocorrer nos mercados e nos ativos à frente é o essencial, é o que pode ditar os ganhos ou as perdas.

Tendências e fatos – é disso que falamos. Precisamos, agora, analisar o pano de fundo macroeconômico e as principais movimentações (globais e internas) dos ativos para saber o que nos espera.

Por isso, nós, da Levante Advice, preparamos esta matéria exclusiva para você, investidor. Aqui, iremos tratar das principais tendências e acontecimentos do primeiro trimestre deste ano e que podem, sem dúvidas, continuar a fazer peso nos ativos (Fundos de Investimento inclusos) nos próximos meses.

Abaixo, trazemos, em tópicos, os pontos pelos quais passaremos:

1. Movimento global de troca de carteira (Growth x Value);

2. Alta da Selic;       

3. Questão da vacinação e volta do comércio ao normal.

Vale ressaltar que não entraremos, ao menos nesta matéria, em questões políticas recentes, posto que, em nossa visão, os pontos acima têm um potencial maior de afetar o seu bolso.

Movimento global de troca de carteira (Growth x Value)

Desde o início do ano, um movimento de mudança de carteira (de ações Growth, que vislumbraram bons resultados em 2020, por ações Value) tem ocorrido em escala global nos investimentos.

Esse movimento, puxado pelos “big sharks” (grandes investidores, como grandes gestores de Fundos) dos mercados internacionais, tem como consequência uma valorização das empresas de valor (Value Stocks) e uma desvalorização de empresas de crescimento (Growth Stocks).

A recente alta da taxa de juros americana de 10 anos, que saiu do patamar de 1.0 para 1.6, por conta das boas perspectivas de retomada da economia por lá, pode ser vista como o principal fator para esse movimento de troca.

Em suma, essa perspectiva de recuperação da economia fez com que os gestores de Fundos de Investimento tivessem – e tenham – preferência por ações de setores mais cíclicos (bancos e energia, por exemplo) para se beneficiar da retomada da economia. E as empresas desse setor são, basicamente, empresas de valor.

Além disso, empresas ligadas a commodities também têm vislumbrado resultados positivos com esse movimento.

Já as empresas de crescimento, como aquelas pertencentes ao setor de tecnologia, vêm passando por “maus bocados”, pois o fluxo de caixa das empresas de crescimento tem prazo (duration) mais longo, e o valor dessas companhias é mais concentrado na perpetuidade.

Peguemos, por exemplo, um caso interno, do Magalu.

Até setembro/outubro do ano passado, as ações do MGLU3 estavam em um movimento de alta leve. De lá para cá, elas entraram em um movimento de estagnação, mantendo-se em um patamar similar, até o início de 2021, quando começaram a traçar um movimento de queda.

Para se ter uma ideia, do início do ano até o dia 26/03, as ações MGLU3 acumulavam queda de 20,63%.

Como se vê, o Magazine Luiza, que por ser visto como uma Growth Stock, posto que está inserido no e-commerce e pode ser considerado, até mesmo, uma tech, sofre com essa troca de carteira.

Por fim, esse movimento tende a continuar em 2021, com as empresas de valor se beneficiando. Gestores de Fundos de Ações brasileiros, ademais, podem também realizar trocas em suas carteiras, visando a capturar a valorização que essas ações podem ter. Fundos mais voltados para ações de tecnologia, tanto brasileiras quanto internacionais, podem ver ganhos pouco expressivos ou, até mesmo, perdas em algumas de suas posições.

Porém, esse movimento, como quase tudo na Bolsa, não é perpétuo. Assim, vale ficar atento aos desempenhos desses papéis para capturar as melhores oportunidades.

Alta da Selic

O Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros em 0,75 ponto percentual na quarta-feira, 17 de março de 2021. Agora, a taxa Selic está em 2,75% ao ano.

A alta ficou acima do consenso, que previa uma elevação de 0,50 ponto percentual.

No Comunicado, o Comitê deixou claro deve realizar outra elevação em maio, de 0,75 ponto percentual.

Assim, em apenas 56 dias, no intervalo entre a primeira reunião de 2021 e a de março, o BC passou de uma posição dovish (mais tolerante com a inflação) para hawkish (mais ortodoxa em termos monetários).

Além disso, em 12 meses, a inflação está em 5,20%, rondando o teto da meta, que é de 5,25%.

A edição mais recente do Boletim Focus (22 de março) mostrou uma forte aceleração nas projeções para a inflação.

O IPCA previsto para 2021 subiu para 4,71%, ante 4,6% da estimativa anterior, e acima dos 3,82% esperados há quatro semanas.

Mas, em suma – e indo direto ao ponto: essa alta da taxa de juros Selic deve ter pouco impacto na carteira de investimentos das pessoas físicas.

Os principais setores que serão impactados, positiva ou negativamente, são estes:

  • Seguradoras;
  • Bancos; e
  • Construção civil

Seguradoras e bancos

A alta da Selic beneficia diretamente as seguradoras, pois vai elevar o resultado financeiro proveniente dos rendimentos do caixa e das aplicações financeiras, que são majoritariamente investidos em renda fixa (CDI).

Ademais, as seguradoras são obrigadas a manter uma reserva técnica de caixa em montante alto para garantir a cobertura dos potenciais sinistros (acionamento do seguro) de toda a sua carteira, com o objetivo de manter alta liquidez nesta reserva.

Por isso, grande parte do lucro líquido das seguradoras é bastante sensível à variação da taxa básica de juros.

No caso dos bancos, o aumento da taxa de juros pode aumentar o spread, com crescimento direto na margem financeira bruta dos bancos, além de crescimento do resultado da linha de seguros de sua própria carteira.

Por fim, há, também, os ganhos provenientes das reservas da própria tesouraria do banco, que são as reservas de caixa da própria empresa para utilização e contingência de suas próprias operações, que também tem uma parte atrelada à taxa de juros da economia.

Construção civil

O aumento da Selic pode afetar a demanda por imóveis no médio prazo.

Existe a possibilidade de um aumento no custo do financiamento imobiliário devido à esperada elevação da taxa Selic até o final de 2021 (projeção de 5% ao ano no período).

Pelo perfil de crédito concedido ser de longuíssimo prazo, uma mínima alteração nas taxas de juros de financiamentos tem impactos significativos no valor final total do pagamento a ser realizado pelo comprador do imóvel.

Isso gera, em suma, um aumento no valor das parcelas em mesma proporção e pode, ainda, enxugar a forte alta da demanda por imóveis nestes últimos anos, com a taxa de juros em trajetória de queda.

Olhando para o contexto atual especificamente, as grandes construtoras seguem com ritmo acelerado de obras e lançamentos, a fim de aproveitar ao máximo esta demanda aquecida para vender o quanto antes e capitalizar este ciclo do setor aquecido.

Porém, essa forte demanda por materiais de construção e a disputa cada vez mais acirrada por terrenos em boa localização vem aumentando os custos de obras, ajudado pelo ciclo positivo de commodities e pelo câmbio nas alturas, o que torna o aço e cimento, entre outros insumos, cada vez mais caros.

Com um possível movimento de alta no custo dos financiamentos (enxugando a demanda gradualmente), com o número alto de lançamentos e com os custos em trajetória ascendente, o cenário não se pinta como tão favorável para o setor no médio prazo, podendo gerar uma disputa por compradores que podem minar as margens das construtoras.

Por fim, para concluir, as empresas que mantiverem disciplina de capital e rápido ritmo de venda de construção com portfólio de alta qualidade podem sobressair neste cenário – em detrimento das construtoras que tentam apenas surfar o momento, sem levar em conta uma estratégia bem planejada para a execução nas operações.

Questão da vacinação e volta do comércio ao normal

Um dos pontos principais, se não o principal, atualmente para o mercado brasileiro é a vacinação.

E não resta dúvidas sobre isso – mesmo no âmbito global.

Quando, por exemplo, o presidente americano Joe Biden anunciou que a meta é vacinar 200 milhões de americanos durante seus 100 primeiros dias de mandato, duplicando a meta anterior, os mercados entraram, no dia, em um movimento de euforia. No dia do anúncio, os principais pregões da Ásia e da Europa abriram em alta.

Por aqui, estamos, porém, a passos lentos – mas, enfim, progredindo.

No dia 26 de março, o instituto Butantan anunciou que vai solicitar à Anvisa uma autorização para iniciar os testes das fases 1 e 2 para uma vacina brasileira contra o coronavírus.

A vacina brasileira, denominada Butanvac, começou a ser testada em 27 de março de 2020 e já passou pelos testes pré-clínicos em animais.

Ademais, de acordo com o Instituto, dependendo dos resultados das fases 1 e 2, é possível haver 40 milhões de doses da vacina disponíveis ainda neste ano.

O desenvolvimento de uma vacina nacional representa uma enorme segurança para a economia.

Porém, como a mutação rápida do coronavírus permite algumas comparações com o vírus da gripe, não se descarta a hipótese de que seja necessário promover regularmente campanhas de imunização.

Se houver uma vacina nacional à disposição, isso reduzirá significativamente a dependência de insumos importados. Eles não apenas custam caro, mas sua disponibilidade está sujeita à disputa global.

Um fornecimento regular e confiável permitirá manter baixo o número de contaminados e normalizar as relações econômicas no Brasil.

O mercado, como bem deixou claro a recente Carta dos Economistas, espera o quanto ano por uma vacinação mais efetiva e rápida.

E o motivo é simples: mais gente vacinada quer dizer mais gente podendo sair de casa, produzir e consumir, o que antecipará a normalização da economia.

COMPARTILHE ESTE ARTIGO
Compartilhe Compartilhe Compartilhe Compartilhe